Lesões Vértebro-Medulares – a perspectiva da reabilitação Filipa Faria

Filipa Faria1

Lesões vértebro-medulares – A perspectiva da reabilitação Spinal cord lesions – The rehabilitation perspective

Resumo Este trabalho pretende proporcionar uma visão geral sobre a problemática da lesão medular, focando essencialmente os aspectos relacionados com a reabilitação. A lesão medular atinge indivíduos jovens numa fase activa da vida, podendo condicionar graves incapacidades. Na maioria dos casos a etiologia é traumática, constituindo os acidentes de viação a sua principal causa. Até meados do século passado a sobrevivência era muito reduzida e a morte ocorria sobretudo por problemas nefro-urológicos. Com a evolução do conhecimento médico e com os meios disponibilizados pela tecnologia tem sido possível um aumento significativo da esperança de vida. Também as causas de morte sofreram alterações ao longo do tempo, sendo actualmente as complicações respiratórias, sobretudo a pneumonia, a primeira causa. No quadro clínico da lesão medular podemos considerar uma fase inicial de choque medular, em

Abstract The present study provides an overview of the spinal cord injury focusing mainly on aspects related to rehabilitation. Spinal cord injury affects young people in an active phase of life, determining severe handicaps. Most of the lesions are traumatic, caused by car accidents. Until fifty years ago, the survival of individuals with spinal cord injury was very reduced and the leading cause of death was renal failure. Due to developments in medical knowledge and technical advances, the survival rates have significantly improved. The causes of death have also changed being respiratory complications, particularly pneumonia, the leading causes. Immediately after a spinal cord lesion there is a phase of spinal shock which is characterized by flaccid paralysis and bladder and bowel retention. Progressively there is a return of the spinal cord automatism with the beginning of some reflex ac-

Assistente Hospitalar de Medicina Física e de Reabilitação, Mestre em Engenharia da Saúde pela Universidade Católica de Lisboa. Serviço de Lesões Vértebro-Medulares do Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão. Directora do Serviço: Drª Filipa Faria Centro de Medicina de Reabilitação de Alcoitão, Serviço de Lesões Vértebro-Medulares Rua Conde Barão 2649-506 Alcabideche. 1

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que existe uma paralisia flácida e retenção urinária e fecal; progressivamente inicia-se a fase de automatismo medular com retorno de algumas actividades reflexas da medula Através do exame neurológico é possível muito precocemente estabelecer o prognóstico motor e funcional e planificar o programa de reabilitação. Podemos considerar três fases no programa de reabilitação: a primeira, corresponde ao período de acamamento para estabilização cirúrgica e médica da lesão esquelética, sendo fundamental prevenir ou tratar as complicações relacionadas com a imobilidade e iniciar a reeducação dos esfíncteres; na segunda, pretende-se atingir a funcionalidade ao nível de cadeira de rodas; a terceira fase consiste no treino em ortostatismo. O programa de reabilitação engloba ainda actividades desportivas e recreativas, bem como o acompanhamento psicológico e social para uma abordagem global da lesão medular.

tivities. Based on neurological evaluation it is possible to predict motor and functional recovery and establish the rehabilitation program. We can consider three phases on the rehabilitation program: the first while the patient is still in bed, directed to prevent or treat complications due to immobility and begin sphincters reeducation; the second phase is intended to achieve wheelchair autonomy; the last phase is training in ortostatism. The rehabilitation program also comprises sports and recreational activities, psychological and social support in order to achieve an integral of the individual with a spinal cord injury. Key words: Spinal cord, etiology, epidemiology, clinics, rehabilitation.

Palavras-chave: Lesão medular, etiologia, epidemiologia, quadro clínico, reabilitação.

Intr odução Introdução Das múltiplas formas de incapacidade que podem atingir o ser humano, a lesão medular é sem dúvida uma das mais dramáticas. Se pensarmos na importância fisiológica da medula, não só como transmissor de impulsos e mensagens do cérebro para todas as partes do corpo, e vice-versa, mas também como um centro nervoso em si próprio, controlando funções como postura, micção, intestino, função sexual, respiração e regulação S 46

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térmica, apercebemo-nos das consequências que uma lesão a este nível poderá ter. A interrupção da passagem de informação resulta em incapacidades funcionais importantes abaixo da zona lesada. A intervenção da reabilitação é dirigida a avaliar e manter o funcionamento dos múltiplos órgãos e sistemas, restaurar ou substituir as funções perdidas com o objectivo final de reintegrar o indivíduo na sociedade. É fundamental estabelecer, o mais precocemente possível, um prognóstico D E

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funcional, de forma a que o doente e sua família possam investir na obtenção de objectivos realistas e iniciar desde logo o planeamento da sua reinserção social. Para determinar a gravidade da lesão, estabelecer o prognóstico e planificar a reabilitação, estabeleceram-se padrões internacionais para uniformização de critérios de classificação neurológica e funcional, propostos pela ASIA (American Spinal Injury Association)1. Classificação ASIA das lesões medulares Através do exame neurológico é possível determinar o nível sensitivo e o nível motor, pela avaliação de pontos-chave para a sensibilidade (ao tacto e à picada) e de músculos chave para a motilidade (nos membros superiores e nos membros inferiores). O nível neurológico corresponde ao segmento mais caudal com função sensitiva e motora normal nos dois lados do corpo. Se a alteração das funções motora e/ou sensitiva se verificar no segmento cervical estamos em presença de uma tetraplegia por envolvimento dos quatro membros; se existir perda ou alteração neurológica nos segmentos dorsal, lombar ou sagrado, a lesão decorrente é classificada como paraplegia. Considera-se que uma lesão é completa na ausência de função motora e sensitiva no segmento sagrado mais inferior (correspondente aos metâmeros S4-S5) 2; se existir preservação parcial das funções motora e/ /ou sensitiva abaixo do nível neurológico, incluindo o segmento sagrado S4-S5, considera-se a lesão incompleta. Para classificar o grau de deficiência utiliza-se uma escala em 5 níveis de gravidade R E V I S T A

decrescente, em que “A” designa a lesão completa, “B” a lesão incompleta com preservação apenas da sensibilidade; “C” e “D” designam lesões incompletas com preservação parcial da sensibilidade e da motilidade, e “E” utiliza-se nas lesões medulares com funções sensitiva e motora normais. Epidemiologia A maioria dos estudos sobre a incidência de lesões medulares é retrospectiva ou baseada numa população hospitalar, não proporcionando uma visão generalizada da sua verdadeira incidência na população em geral3,4,5. Não existem estudos epidemiológicos de âmbito nacional. Os dados nacionais de que dispomos dizem respeito a um estudo efectuado na região Centro entre 1989 e 1992 e apenas a lesões de etiologia traumática. A taxa de incidência encontrada foi de 5,8/100 000 habitantes, sobrevivendo 2,5/100 000 habitantes6. Nos Estados Unidos, a incidência estimada de lesões medulares traumáticas é de 55/ /milhão de habitantes, sendo 35/milhão de habitantes os que sobrevivem, representando cerca de 11 000 novos casos/ano7. A epidemiologia das lesões não traumáticas não está bem estabelecida8. Até há cerca de 60 anos, a sobrevivência de um lesionado medular era muito reduzida9; a melhoria dos cuidados de emergência prestados no local do acidente, os avanços no tratamento médico e cirúrgico e a introdução de procedimentos de reabilitação mais sofisticados conduziram a uma diminuição acentuada da taxa de mortalidade10. A esperança de vida depende do nível neurológico e do tipo de

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lesão, sendo actualmente para um tetraplégico completo cerca de 70% da de um indivíduo saudável, para um paraplégico completo de 86% e para um paraplégico incompleto “D” de 92%11. As causas de mortalidade têm sofrido alterações ao longo do tempo. Com a melhoria no tratamento da bexiga neurogénea, as complicações relacionadas com o tracto urinário, nomeadamente a insuficiência renal, deixaram de ser a principal causa de morte nos lesionados medulares 6,12, 12 . Estudos recentes têm sugerido que as complicações respiratórias, particularmente a pneumonia, são responsáveis pelo maior número de mortes no caso dos tetraplégicos. Se considerarmos os paraplégicos, as doenças cardiovasculares, a septicemia, o suicídio e as neoplasias são actualmente as principais causas6,12,13. A embolia pulmonar é também uma causa de morte, independentemente do nível de lesão 6,17. Etiologia A etiologia é diversa, podendo identificar-se causas médicas (por exemplo, degenerativas, vasculares, neoplásicas, infecciosas) ou traumáticas (quedas, acidentes de viação, acidentes relacionados com a prática desportiva, acidentes por arma de fogo, entre outros). A idade tem uma influência considerável na etiologia das lesões medulares; nos grupos etários abaixo dos 40 anos, o traumatismo é a causa da lesão medular em mais de 85% dos casos. São os indivíduos jovens do sexo masculino os mais expostos, quer pela actividade profissional, quer pela prática desportiva ou, simplesmente, pela utilização de um meio de transporte14. S 48

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Com o envelhecimento da população, a idade média na data da lesão aumentou dos 28,6 anos no final dos anos 70 para 38,0 anos em 20006. Quadr o clínico Quadro A lesão medular resulta em alterações da função motora, sensitiva e autonómica nos segmentos situados abaixo do nível de lesão. O quadro clínico depende da fase de evolução da lesão (aguda, subaguda ou crónica), da sua localização (segmento cervical, dorsal, lombar ou sagrado) e ainda do tipo de lesão (completa ou incompleta). Imediatamente após a instalação de uma lesão medular, surge retenção urinária e fecal e perda da força muscular e das sensibilidades abaixo da lesão. A paralisia é flácida, acompanhada por abolição dos reflexos ósteo-tendinosos. Este quadro de instalação aguda é designado por choque medular e pode prolongar-se até 6 meses após a lesão. Progressivamente inicia-se a fase de automatismo medular, com retorno de algumas actividades reflexas da medula, normalmente inibidas pelo controlo exercido pelo córtex cerebral. Os reflexos tendinosos tornam-se vivos, difusos e policinéticos; o tónus muscular aumenta e aparece a espasticidade (aumento da resistência à mobilização passiva do membro); os esfíncteres vesical e intestinal começam a apresentar uma actividade automática. Objectivos da reabilitação O quadro clínico resultante de uma lesão medular é complexo, com atingimento de múltiplos órgãos e sistemas, pelo que para o tratamento destes doentes é necessário uma equipa médica multidisciplinar e uma D E

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equipa de reabilitação multiprofissional. O tratamento de reabilitação tem como objectivo maximizar as capacidades e as competências funcionais de cada indivíduo, ajudando-o a refazer o seu projecto de vida. Assim, é fundamental uma abordagem integral, que incida não apenas nos problemas clínicos, mas que atenda também aos aspectos emocionais, sociais, desportivos, lúdicos e de formação, contribuindo para uma melhoria da qualidade de vida, maior independência e participação na sociedade. Os cuidados de reabilitação são iniciados o mais precocemente possível e vão depender do quadro clínico e da fase de evolução da lesão. Assim, na fase aguda, em que o indivíduo se encontra acamado, destinam-se a manter a integridade cutânea e as amplitudes articulares, efectuamdo-se alternâncias de decúbito e de posicionamentos de 2/2 horas e mobilizações articulares passivas suaves. A reeducação dos esfíncteres é iniciada através da realização de sondagens intermitentes para esvaziamento vesical e da instituição de treino intestinal com emoliente e supositório. A cinesiterapia respiratória, sobretudo nas lesões dorsais altas e cervicais, deve ser realizada com frequência para manter a higiene brônquica e facilitar a eliminação de secreções. Deve ser considerada a profilaxia da trombose venosa profunda e da hemorragia digestiva por úlcera de stress. Para preparar o levante inicia-se um treino progressivo no plano inclinado. A 2.ª fase caracteriza-se por uma reabilitação mais activa, logo que o indivíduo tolere o levante para a cadeira de rodas. Através de exercícios ou actividades, proR E V I S T A

cede-se a um programa de fortalecimento muscular e de endurance dos músculos acima da lesão, à normalização do tónus, ao treino de equilíbrio, ao treino funcional no colchão e na cadeira de rodas. O treino funcional na cadeira de rodas é essencial para garantir a máxima autonomia possível ao indivíduo. Treina-se a queda para o chão e o subir para a cadeira novamente, a deslocação em pisos irregulares, o subir e descer rampas e degraus do passeio. Se o indivíduo apresenta uma lesão incompleta com movimentos activos abaixo do nível de lesão, efectua-se também o fortalecimento dos músculos parcialmente comprometidos, através de diversas técnicas, entre as quais a estimulação eléctrica. Simultaneamente, procede-se à aprendizagem de técnicas dirigidas à autonomia na realização de actividades de vida diária, nomeadamente higiene pessoal, vestuário, banho e treino de transferências (para o mesmo nível e para desníveis) a cama, sofá, cadeira de banho ou banheira, automóvel, etc.). Mantêm-se os cuidados com a integridade da pele através da realização de elevações frequentes na cadeira de rodas para alívio da pressão, bem como a cinesiterapia respiratória e ainda as mobilizações passivas ou activas assistidas para manutenção das amplitudes articulares. Após retorno do automatismo medular, poder-se-á alterar o treino vesical instituído de acordo com a avaliação urodinâmica. Nesta fase, em que já existe uma razoável tolerância à deambulação em cadeira de rodas e após ensino à família dos cuidados e de algumas técnicas básicas para assegurar a continuidade dos cuidados no domicílio,

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os doentes são encorajados a deslocar-se a casa nos fins-de-semana. Esta experiência proporciona oportunidades de socialização mas também de reconhecimento de dificuldades que poderão ser discutidas com a equipa de reabilitação, de forma a encontrar estratégias para as ultrapassar. A 3.ª fase corresponde ao treino de ortostatismo, que poderá ser efecuado em cadeira de rodas com verticalização, numa mesa tipo standing frame, entre barras com ou sem ortóteses. O treino de ortostatismo é benéfico sob diversos aspectos: por promover a carga, essencial para a preservação da massa óssea, por melhorar a função urinária, intestinal e respiratória e por contribuir para o bem-estar psicológico. Nas lesões com nível neurológico inferior a D10, e de acordo com o potencial do indivíduo, efectua-se o treino de marcha com ou sem ortóteses, iniciando-se entre barras e progredindo posteriormente para a marcha com andarilho, pirâmides, canadianas, ou eventualmente sem auxiliares de marcha; efectua-se também o treino em pisos irregulares, bem como a subida e descida de escadas e rampas. O treino de marcha em tapete rolante com suspensão parcial do peso corporal proporciona uma forma de activação do padrão de marcha automático de origem medular. Vários estudos têm sido publicados recentemente salientando os resultados obtidos na marcha em indivíduos com lesões incompletas15,16. No Quadro I apresentam-se as principais complicações que podem surgir em cada órgão ou sistema. A úlcera de pressão, a pneumonia e a disreflexia autonómica são as complicações que surgem com maior S 50

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Quadro I – Principais complicações da lesão medular „ Revestimento cutâneo: úlceras de pressão „ A. cardiovascular: tromboembolismo, hipotensão ortostática, disreflexia autonómica, bradiarritmia „ A. respiratório: insuficiência respiratória, infecções respiratórias, atelectasias „ A. digestivo: intestino neurogéneo, hemorragia digestiva, hemorróidas, fissuras „ A. génito-urinário: bexiga neurogénea, infecções urinárias, litíase, insuficiência renal; disfunção eréctil e ejaculatória „ Músculo-esquelético: paralisia, alterações do tónus (flacidez ou espasticidade), calcificações heterotópicas, osteoporose „ Psíquico: depressão reactiva

frequência nos doentes internados em unidades hospitalares17. As infecções do tracto urinário constituem também, particularmente em doentes com algaliação permanente e em ambiente hospitalar, uma importante causa de co-morbilidade18. Avanços no tratamento e reabilitação da lesão medular Os primeiros cuidados prestados a indivíduos suspeitos de lesão medular são decisivos para o seu prognóstico; qualquer movimento ou até as manobras de reanimação podem agravar a lesão. A criação de equipas especialmente treinadas para atender os politraumatizados contribuiu para a diminuição da mortalidade e melhoria da sobrevida. Nos anos mais recentes verificaram-se importantes avanços na compreensão da lesão medular, bem como no seu tratamento. O desenvolvimento da imagiologia, nomeadamente da tomografia computadorizada e da ressonância magnética, permitiu visualizar e caracterizar de forma mais precisa a lesão, fornecendo D E

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dados importantes para definir o tratamento mais adequado. Por outro lado, o estudo NASCIS 2, que salientou o benefício neurológico obtido nos doentes submetidos à administração de metilprednisolona nas primeiras horas, constituiu outro marco importante19. O extraordinário desenvolvimento tecnológico verificado nas últimas décadas disponibilizou no campo da medicina de reabilitação meios de intervenção quer para o tratamento de complicações da lesão medular quer na substituição de funções perdidas, com reflexos na qualidade de vida. A título de exemplo, podemos salientar: No caso de tetraplégicos com lesões medulares acima de C4, o desenvolvimento de ventiladores cada vez mais portáteis e a possibilidade de deambular em cadeiras de rodas de condução eléctrica permitiram que indivíduos gravemente incapacitados pudessem sobreviver e mesmo deslocarse de forma autónoma. Para o tratamento da dor e da espasticidade refractárias à terapêutica oral, foram desenvolvidos dispositivos electrónicos que são implantados de forma a permitir a administração directa no espaço intratecal de fármacos com bons resultados e menor toxicidade sistémica. As neuropróteses consistem em neuroestimuladores implantados e ligados ao sistema nervoso através de eléctrodos. A aplicação da estimulação eléctrica no neurónio motor, de forma a ultrapassar a zona de lesão, tem como objectivo restaurar funções, nomeadamente a respiração (através do implante de marcapasso diafragmático), o controlo dos esfíncteres vesical e intestinal e a função sexual (pela R E V I S T A

colocação de neuroestimuladores nas raízes sagradas, permitindo o retorno a um controlo voluntário sobre os esfíncteres, bem como a possibilidade de obter uma erecção) e ainda a função de preensão global ao nível da mão (pelo implante do sistema freehand®, que permite segurar um copo ou escrever). A criteriosa selecção dos casos é fundamental para a obtenção de bons resultados. Relativamente às tecnologias de apoio, destinadas a aumentar, manter ou melhorar as capacidades funcionais do indivíduo, salientam-se os computadores activados pela voz, que permitem a ligação do indivíduo ao mundo através da internet, ou os que são utilizados por exemplo nas “casas inteligentes” e que permitem o controlo do ambiente, ligar/desligar a iluminação, abrir/fechar portas, atender o telefone, entre outras; estas inovações diminuem de forma significativa o grau de dependência com impacto positivo na qualidade de vida deste indivíduos. Contudo, a utilização destas tecnologias tem sido limitada pelo seu elevado custo. Linhas de investigação A evolução no conhecimento médico sobre a fisiopatologia da lesão medular permitiu compreender que esta não se limita à lesão inicial, evoluindo nas horas seguintes; paradoxalmente, este facto representa oportunidades de intervenção. Actualmente, vários estudos estão a ser desenvolvidos para avaliar formas de limitar o agravamento da lesão primária20,21,22,23,24; outras abordagens destinam-se a promover a mielinização25,26, a regeneração neuronal27,28, ou a restabelecer a comunicação interrompida pela lesão

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através de enxertos de tecidos ou células29,30,31. Conclusão O prognóstico dos lesionados medulares alterou-se profundamente nas últimas décadas, passando de um tempo de sobrevida muito reduzido para se aproximar da média global da longevidade. Com os meios disponibilizados pelo progresso científico e tecnológico, a reabilitação concretiza cada vez mais e melhor o objectivo de proporcionar às pessoas com lesão medular os meios para que possam manter ou desenvolver uma elevada qualidade de vida. Bibliografia 1. www.asia-spinalcord.org. 2. Ditunno JF. The international standards booklet for neurological and functional classification of spinal cord injury. Paraplegia 1994; 32: 70-80. 3. Paynes SR, Waller JA. Trauma registry and trauma center biases in injury research. J Trauma 1989; 29: 424-9. 4. Saboe LA, Reid Dc, Davis LA, Warren SA, Grace MG. Spine trauma and associated injuries. J Trauma 1991; 31: 43-8. 5. Garcia-Reneses J, Herruzo-Cabrera R, MartinezMoreno M. Epidemiological study of spinal cord injury in Spain 1984-85. Paraplegia 1991; 28:180-190. 6. Martins F. Epidemiologie et prise en charge des blessés medullaires traumatiques. Évaluation dans la région centre du Portugal. Thèse de Médicine, Bourgogne, 1998. 7. www.spinalcord.uab.edu. Spinalcord injury information network; Facts and figures at a glance – August 2004. 8. Murray PK, Kusior MF. Epidemiology of nontraumatic and traumatic spinal cord injury. Arch Phys Med Rehab 1994; 65: 634. 9. Guttman L. in: “Historical background” in Spinal cord injuries comprehensive management and research.ed Blakckwell scientific publications, Oxford

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The present study provides an overview of the spinal cord injury focusing mainly on aspects related to rehabilitation. Spinal cord injury affects youn...
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